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A propósito do cinquentenário do Vaticano II

 

Há 50 anos o Papa João XXIII, então considerado um papa de transição, surpreendia a igreja anunciando, na sua mensagem de Natal, a realização do Concílio Ecuménico do Vaticano II.

O bom Papa João, não perdeu tempo, pese embora a desconfiança da ala católica mais conservadora que considerou o Cardeal Roncalli, ex-Arcebispo de Veneza, um perigoso maçon.

A magna reunião da Igreja católica, que reuniu em Roma cerca de 2000 bispos e representantes de outras igrejas cristãs, foi inaugurado em outubro de 1962 e terminou três anos mais tarde, já sob o pontificado de Paulo VI.

Foi uma lufada de ar fresco no interior da igreja católica, um tempo de reflexão, propiciador da renovação há muito ansiada pelos fiéis mais ativos e conscientes da necessidade de responder às questões que o mundo então vivia, fosse na desenvolvida Europa, fosse nos países do terceiro mundo.

Acompanhei esse período com o interesse de um jovem que faz da mudança e da renovação uma forma de vida; da novidade, um modo de ser permanente que dá sentido à esperança num mundo melhor, sem desigualdades e sem peias de qualquer espécie.

A presença da igreja portuguesa no concílio, não dava garantias de mudança. O episcopado da altura, excepto o bispo do Porto, exilado no Vaticano, e o Bispo da Beira, Moçambique, eram as únicas vozes discordantes. O regime de Salazar, amordaçava os católicos progressistas e nem as encíclicas papais de João XXIII - Mater et Magistra e Pacem in Terris sobre o desenvolvimento e os direitos humanos - tinham leitura livre.

Portugal vivia amordaçado, como afirmou Raúl Rego por uma hierarquia imobilista, conformada com a ditadura do regime e fechada num pietismo sem consequências na luta pela liberdade e pela justiça. Tal como hoje, a emigração era o destino libertador para milhares e milhares de jovens.

Num ambiente de censura, as sessões conciliares só eram seguidas muito mais tarde, através de livros de cronistas como: Martin Descalso (espanhol) e Henry Fesquet (francês) e do teólogo Bernard Haering. Foi um tempo difícil na igreja do silêncio, como designou um grupo de católicos progressistas a propósito da censura à enciclica de Paulo VI – Populorum Progressio.

No cinquentenário do Vaticano II, pretende-se redescobrir a doutrina das constituições, decretos e declarações, cujas orientações pastorais e princípios teológicos foram praticamente silenciados. A começar pela constituição sobre a Igreja – Lumen Gentium – onde a expressão Povo de Deus, colegialidade dos bispos e outras, foram apagadas do discurso oficial, em favor da autoridade papal e da cúria romana.

O mesmo se diga do Espírito renovador e aberto ao mundo que perpassa pela constituição sobre A Igreja no Mundo, Gaudium et Spes, onde se atualiza toda a Doutrina Social da Igreja e se propõe saídas humanistas, solidárias e justas para os problemas que a humanidade vivia e ainda hoje vive. Esses problemas, porque não resolvidos, originaram a crise que vivemos.

Impõe-se por isso que a Igreja - Povo de Deus – nomeadamente: a hierarquia, papa, bispos e padres, cuja missão é ensinar o Evangelho, mais do que governar, releiam e divulguem a doutrina social da Igreja.

Na sua mensagem da quaresma do ano passado, o Bispo dos Açores, afirmava que a “escuta e meditação” da palavra de Deus deve conduzir à “leitura assídua e ao estudo aturado da Bíblia, bem como ao aprofundamento da Doutrina Social da Igreja, que é a aplicação do Evangelho de Jesus à situação concreta da vida”. E acrescentava: “Não é possível construir uma sociedade mais justa e fraterna, sem ter em atenção os critérios e as directrizes da Doutrina Social da Igreja, que rejeita, tanto o Capitalismo de Estado, como o Liberalismo selvagem”.

Sou do tempo em que as pregações das celebrações litúrgicas festivas,  ensinavam os documentos conciliares e as encíclicas sociais. Muitos jovens da minha geração foram “tocados” por esses princípios, de tal modo que, hoje, a sua visão da economia, da justiça e do mundo obedece a critérios que não se conformam com as doutrinas económicas e políticas atuais.

Há dias, o Presidente da Comissão Nacional “Justiça e Paz” criticava o facto de se ter silenciado ou ignorado o ensino da doutrina social da Igreja nos seminários. Impõe-se alterar, rapidamente, esta situação.

Quando tudo parece estar em causa, a Igreja, fruto da reflexão e da sua experiência secular, aponta sempre perspetivas corretas para as questões da justiça, da dignidade humana e dos direitos dos povos, problemas tão antigos como a existência do homem sobre a terra.

 

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